Por Peter Amsterdam
Janeiro 9, 2018
[The Stories Jesus Told: Counting the Cost, Luke 14:25–33. Two Discipleship Parables]
No capítulo 14 do Evangelho segundo Lucas, lemos alguns dos menos palatáveis ensinamentos de Jesus sobre discipulado. Uma delas é a Parábola da Grande Ceia,[1] que fala dos que preferem seus interesses pessoais ao chamado para a comunhão com Deus. O texto nos fala que ia com Ele grande multidão[2] e foi para ela que Ele disse estas duras palavras:
Se alguém vier a mim, e não aborrecer a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs, e até mesmo a sua própria vida, não pode ser meu discípulo. Qualquer que não tomar a sua cruz, e não vier após mim, não pode ser meu discípulo.[3]
Depois de lhes dizer que os que quisessem segui-lO teriam de fazer sacrifícios, contou duas histórias curtas, mas poderosas com respeito ao discipulado e à necessidade de pensar cuidadosamente sobre o custo de segui-lO.
A primeira parábola diz:
Se algum de vós está querendo edificar uma torre, não se assenta primeiro a fazer as contas dos gastos, para ver se tem com que a acabar? Para que não aconteça que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a escarnecer dele, dizendo: Este homem começou a edificar e não pôde acabar.[4]
A expressão “se algum de vós” usada no início indica que a pergunta é retórica, cuja resposta prevista é “ninguém”. Jesus também usou perguntas retóricas similares para introduzir outras parábolas:
“Qual de vós terá um amigo e se este for procurá-lo à meia-noite, e lhe disser: Amigo empresta-me três pães…”[5]
Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove e não vai após a perdida até achá-la?[6]
Qual de vós terá um servo a trabalhar na lavoura ou a apascentar o gado, a quem, voltando ele do campo, diga: Chega-te e assenta-te à mesa?[7]
Nessa parábola, subentende-se que ninguém em seu juízo perfeito começaria a erguer um prédio sem antes estimar o custo e avaliar se teria os recursos para concluir a obra.
As Escrituras falam de várias torres, algumas construídas, aparentemente, para fins militares:
Sobre a minha torre de vigia estarei.[8]
O dia do Senhor dos Exércitos será contra todo soberbo e altivo, e contra todo o que se exalta… contra toda torre alta, e contra toda muralha fortificada.[9]
Tens sido o meu refúgio, uma torre forte contra o inimigo.[10]
Torre forte é o nome do Senhor; para ela corre o justo e está seguro.[11]
Às vezes, eram construídas torres para a produção agrícola:
Ele a cavou e a limpou das pedras, e a plantou de excelentes vides. Edificou no meio dela uma torre, e construiu nela um lagar.[12]
Então Ele começou a falar-lhes por parábolas: Um homem plantou uma vinha, cercou-a com um muro, construiu um lagar, edificou uma torre, arrendou-a a uns lavradores, e saiu de viagem.”[13]
Torres eram usadas para habitação temporária, para armazenar equipamentos e estocar a produção, assim como para pontos de observação das culturas, contra a ação de ladrões e animais.[14]
No contexto da parábola objeto deste artigo, Jesus provavelmente referia-Se a uma torre que seria usada em atividades agrícolas. O proprietário da terra tem boas intenções e uma torre lhe trará benefícios. Além da proteção de suas plantações ou animais do ataque de ladrões ou predadores, também o ajudará a conquistar o respeito dos vizinhos e melhorará sua propriedade. Contudo, se esse homem for tolo e não estimar o custo para verificar se tem o que é preciso para terminar a obra, será ridicularizado pelos demais.
À época, o respeito e a honra eram muito importantes, pelo que a vergonha devia ser evitada a todo custo. As consequências do mal planejamento seria que todos veriam o prédio inacabado e ririam do homem por causa do seu erro e tolice.
Ao dizer que o homem que não fizesse o orçamento da obra seria motivo de zombaria, Jesus sugere que ele perderia prestígio, seria motivo de chacota na aldeia e ridicularizado. Jesus com isso estava desafiando aqueles que Ele chamava para segui-lO a considerar o passo que estariam dando e os respectivos desdobramentos, ou seja, que avaliassem o custo do discipulado, e tomassem uma decisão sábia e bem pensada, para não assumirem um compromisso que não poderiam honrar.
Outra parábola, irmã gêmea da anterior é:
Ou qual é o rei que, indo para combater outro rei, não se assenta primeiro para calcular se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra ele com vinte mil? Doutra maneira, estando o outro ainda longe, manda embaixadores, e pede condições de paz.[15]
Enquanto que a segunda parábola comunica a mesma mensagem que a anterior, trata da decisão de um rei de arriscar a vida de dezenas de soldados, além da própria, ou seja, há muito mais em jogo. O homem que não faz o orçamento para levantar a torre terá de lidar com o constrangimento e a vergonha, mas o rei se expõe ao risco de morrer e sacrificar a vida de muitos soldados, além de perder o reino.
Apesar de os riscos da segunda parábola serem muito mais elevados, o ensinamento é o mesmo. O rei tem de avaliar com sabedoria a situação. Seu exército conta metade do número de soldados de seu adversário. Para vencer, suas tropas precisariam ser muito superiores que o inimigo em habilidade. Além disso, teriam de ser extraordinariamente corajosos para confiantemente enfrentar uma força duas vezes maior que a sua. Além disso, também precisariam considerar outras variáveis, tais como o conhecimento do território, condições climáticas, melhores linhas de provisão, a relação com a população civil, etc. — para compensar a disparidade numérica. O monarca terá de decidir se há condições para que seus soldados vençam e se sequer vale a pena travar essa batalha.
O rei precisaria sentar e calcular antes de decidir. A palavra grega aqui traduzida para calcular em outras versões é aconselhar-se, consultar, pensar. Além de pensar e calcular, um líder sensato consultará outras pessoas. Se ficar claro que o risco é excessivo e que a probabilidade de derrota é elevada demais, a melhor opção é procurar contornar a situação, enquanto o exército inimigo ainda está muito distante. O rei deve enviar uma delegação ao exército mais numeroso e pedir termos de paz.
A primeira parábola comunica que quem estiver considerando ser um discípulo de Jesus deve contar o custo para ver se tem os elementos necessários ao discipulado. Na segunda, o interessado em ser discípulo deve avaliar cuidadosamente se tem chances de sucesso. Essas parábolas provocam quem está considerando o discipulado a avaliar sua situação, para que, ao tomar a decisão de seguir Jesus, o faça com muito cuidado. É um chamado sobre o qual se deve ter certeza e clareza, antes de se comprometer com o discipulado.
Quando lemos sobre os momentos em que Jesus chama Seus primeiros discípulos, admiramo-nos como largaram tudo imediatamente para O seguir.
Andando Jesus junto ao mar da Galileia, viu dois irmãos, Simão, chamado Pedro, e André, os quais lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores. Disse-lhes Jesus: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens. Imediatamente eles deixaram as redes, e o seguiram. Indo um pouco mais longe, viu outros dois irmãos, Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão. Estavam num barco em companhia de seu pai Zebedeu, consertando as redes. Jesus os chamou, e eles, deixando o barco e seu pai, imediatamente o seguiram.[16]
A decisão de seguir o chamado de Jesus não foi tomada, necessariamente, na primeira vez que viram Jesus. No Evangelho segundo João lemos que André, irmão de Simão Pedro, encontrou Jesus e passou o dia com Ele.[17] Na manhã seguinte, encontrou seu irmão, Pedro, a quem disse: “Achamos o Messias.”[18] Nada indica que Pedro ou André tenham começado a seguir Jesus naquele momento. Em Lucas, vemos que Jesus estava ensinando às margens do Lago de Genesaré quando notou dois barcos próximos da margem e pescadores que lavavam suas redes. Jesus entrou em uma das embarcações, pertencente a Simão (Pedro). Ao terminar de ensinar, disse a Simão para voltar para a área de maior profundidade e lançar sua rede. Ao fazer como instruído, o pescador capturou um grande número de peixes, pelo que pediu aos seus companheiros, Tiago e João, que o ajudassem. É nesse momento que lemos que Pedro deixou tudo para seguir Jesus.[19]
Em outras passagens nos Evangelhos, vemos exemplos de como Jesus alertou os que queriam segui-lO com respeito ao custo do discipulado:
Então um escriba aproximou-se dele e disse: Mestre, aonde quer que fores, eu te seguirei. Respondeu-lhe Jesus: As raposas têm covis, e as aves do céu têm ninhos, mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça.”[20]
Jesus não buscava reunir multidões de seguidores, mas aqueles que O seguissem não por causa de Sua popularidade, por Ele alimentar os famintos, ou realizar milagres, mas porque acreditavam profundamente em quem Ele era. Advertiu-os sobre as possíveis consequências do discipulado, para pensarem nos desdobramentos que a decisão lhes traria e para terem certeza de que tinham condições de dar conta das demandas. Depois de lhes apresentar os desafios, as dificuldades e os sacrifícios da vida do discípulo, Ele os chamava para seguir. Sua intenção não era desestimular as pessoas, mas provocá-las a considerar cuidadosamente a escolha que estavam fazendo.
Decidir seguir Jesus é escolher reestruturar sua vida para que se harmonize aos Seus ensinamentos. Significa mudar a maneira de pensar, a prioridade que damos às coisas que consomem nosso tempo, energia e dinheiro. É uma mudança que afeta nossos relacionamentos e a forma como interagimos com os outros, pois somos chamados para ser menos egocêntricos. É um chamado para reformular nossas vidas a tal ponto que estamos dispostos a morrer por Ele, se necessário. É um compromisso para a vida inteira, o qual não deve ser visto com leviandade. Como ilustram essas parábolas, quem considera se tornar um discípulo deve avaliar de forma muito criteriosa o impacto em sua vida e na vida daqueles que lhe são próximos, reconhecer os desafios e, então, se entender que é o que deve fazer, lançar-se de todo o coração a Seu serviço.
Creio ser a melhor decisão, pois não apenas melhora nossas vidas agora, mas por toda e eternidade. Se formos diligentes disseminadores da mensagem de salvação em Jesus, melhoraremos também as vidas dos outros.
25 Certa vez ia com ele grande multidão. Voltando-se, disse-lhes:
26 “Se alguém vier a mim, e não aborrecer a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs, e até mesmo a sua própria vida, não pode ser meu discípulo.
27 Qualquer que não tomar a sua cruz, e não vier após mim, não pode ser meu discípulo.
28 Se algum de vós está querendo edificar uma torre, não se assenta primeiro a fazer as contas dos gastos, para ver se tem com que a acabar?
29 Para que não aconteça que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a escarnecer dele,
30 dizendo: Este homem começou a edificar e não pôde acabar.
31 Ou qual é o rei que, indo para combater outro rei, não se assenta primeiro para calcular se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra ele com vinte mil?
32 Doutra maneira, estando o outro ainda longe, manda embaixadores, e pede condições de paz.
33 Da mesma forma, qualquer de vós que não renuncia a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo.
A menos que indicado o contrário, todas as referências às Escrituras foram extraídas da “Bíblia Sagrada” — Tradução de João Ferreira de Almeida — Edição Contemporânea, Copyright © 1990, por Editora Vida.
[1] Lucas 14:16–24. Ver As Histórias que Jesus Contou: O Grande Banquete.
[2] Lucas 14:25.
[3] Lucas 14:26–27. Para melhor entende estes versículos, leia Jesus—Sua Vida e Mensagem: Discipulado (3ª Parte).
[4] Lucas 14:28–30.
[5] Lucas 11:5. https://directors.tfionline.com/pt/post/historias-jesus-contou-amigo-meia-noite-boas-dadiv/
[6] Lucas 15:4. https://directors.tfionline.com/pt/post/historias-que-jesus-contou-perdidos-e-achados/
[7] Lucas 17:7. https://directors.tfionline.com/pt/post/historias-que-jesus-contou-o-servo-obediente/
[8] Habacuque 2:1.
[9] Isaías 2:12,15.
[10] Salmo 61:3.
[11] Provérbios 18:10.
[12] Isaías 5:2.
[13] Marcos 12:1.
[14] Arland J. Hultgren, The Parables of Jesus (Grand Rapids: William B. Eerdmans Publishing Company, 2000), 139.
[15] Lucas 14:31–32.
[16] Mateus 4:18–22.
[17] João 1:38–42.
[18] João 1:41.
[19] Lucas 5:1–11.
[20] Mateus 8:19–22.
Copyright © 2024 The Family International. Política de Privacidade Política de Cookies