Os Efeitos do Cristianismo (1ª Parte)

Por Peter Amsterdam

Abril 9, 2019

[The Effects of Christianity (Part 1)]

(O conteúdo deste artigo se baseia no livro How Christianity Changed the World [Como o Cristianismo Mudou o Mundo, em tradução livre], escrito por Alvin J. Schmidt[1])

Com a aproximação da Páscoa — a celebração de quando Jesus ressurgiu dos mortos para conquistar a morte e trazer a salvação para o mundo — este parece um momento oportuno para discutirmos os efeitos positivos que, faz dois mil anos, a vida, morte e ressurreição de Jesus têm tido sobre a humanidade. Quando Jesus deu a vida para que aqueles que nEle creem possam ter um relacionamento eterno com Deus, mudou a vida e o destino eterno de bilhões de pessoas. Pela vida dos que nELe creram e O seguiram, Jesus trouxe grandes mudanças para todo o mundo. Esta curta série discutirá algumas das maneiras como os cristãos e o cristianismo tornaram o mundo um lugar melhor.

É certo que muitos valores cristãos se originaram da Torá (o Antigo Testamento), mas o cristianismo tem sido o principal veículo para a divulgação da cultura judaico-cristã e o meio para a divulgação para todo o mundo da mensagem de salvação por intermédio de Cristo.

O valor da vida humana

Jesus nasceu em um momento histórico em que o Império Romano dominava uma importante parte do mundo conhecido. Consequentemente, os padrões morais de Roma permeavam grande parte da sociedade. Os romanos davam pouca importância à vida humana. O valor de alguém existia somente na medida da sua contribuição para o tecido político da sociedade. Isso se observa de várias maneiras no mundo romano, tais como nas práticas do infanticídio, dos jogos de gladiadores e do suicídio.

Os primeiros cristãos, por outro lado, cultivavam uma perspectiva mais sagrada da vida humana, pois acreditavam nos ensinamentos das Escrituras sobre o valor da vida e que os seres humanos são criados à imagem de Deus

Assim Deus criou o homem à Sua imagem, à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou.[2]

Contudo, pouco menor do que Deus o fizeste, e de glória e de honra o coroaste.[3]

Entendiam que Deus honrou a vida humana ao enviar Seu Filho, em carne, como um ser humano

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. … O Verbo se fez carne, e habitou entre nós. Vimos a Sua glória, a glória como do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade.[4]

Como Deus valoriza a vida humana, os primeiros cristãos compreendiam que a vida devia ser honrada e protegida.

Infanticídio e abandono de crianças

Matar crianças logo após o nascimento era uma prática comum no mundo greco-romano. Os recém-nascidos eram mortos por várias razões, tais como nascerem deformados ou frágeis, indesejados, ou porque os pais entendiam que não dispunham dos recursos para cuidar da criança. Sêneca, o filósofo e estadista romano escreveu: Matam-se os cães que estão com raiva; … Se as crianças nascerem defeituosos ou monstruosos, afogamo-las.[5] Muitas vezes, os bebês rejeitados eram mortos por exposição às intempéries, eram abandonados à beira das estradas, em montes de estrume ou em pilhas de lixo.

Para os cristãos, o infanticídio era homicídio e condenado nos escritos dos primeiros cristãos. O Didaquê (escrito entre 85 e 110 d.C) ensina: Não cometerás… infanticídio. Os cristãos nos quatro primeiros séculos d.C. não tinham o poder político para acabar com o infanticídio, comumente praticado na época dos romanos, e eram perseguidos e martirizados. No entanto, nesse período, os cristãos muitas vezes levavam bebês abandonados para suas próprias casas e os adotavam. Muitos não-cristãos, contudo, tinham o hábito de vender as crianças abandonadas como escravos. Em 374 d.C., o imperador Valentiniano formalmente proibiu o infanticídio, por influência de um bispo cristão. Apesar de o infanticídio nunca ter sido totalmente erradicado no Império Romano, os cristãos continuaram a condená-lo. Após a queda de Roma, conforme vários países se constituíram e formaram a Europa ao longo dos séculos, o infanticídio deixou de ser prática comum e passou a ser considerado crime.

Jogos de gladiadores

Outro exemplo da pouca importância atribuída à vida humana nos tempos antigos são os jogos de gladiadores, uma forma de entretenimento em que os homens lutavam, muitas vezes até a morte. Esses eventos populares se realizavam em arenas espalhadas em todo o império de 105 a.C. a 404 d.C. Estima-se que 500.000 pessoas tenham sido mortas só no Coliseu, na cidade de Roma. Às vezes, plateias de 30 mil a  50 mil pessoas assistiam aos jogos. O Imperador Trajano (98-117 d.C.) promovia certames de gladiadores que chegavam a durar quatro meses, durante a quais dez mil gladiadores lutavam, milhares dos quais eram mortos. Tudo isso em nome do entretenimento. (Houve uma época, que cristãos perseguidos foram mortos por sua fé no Coliseu).

Os cristãos da época ficavam revoltados com o odioso desprezo pela vida humana e o flagrante desrespeito ao mandamento de Deus: “Não matarás.” Líderes da Igreja condenaram esses jogos sanguinários e admoestavam os cristãos a não comparecerem nesses eventos. Conforme o cristianismo cresceu, foi finalmente reconhecido como uma religião oficial, quando o Imperador Constantino divulgou o Édito de Milão em 313 d.C. Imperadores cristãos como Teodósio, o grande, e Honório baniram os jogos de gladiadores do Império Romano. Em seu livro sobre a vida em Roma, o autor Jerome Carcopino afirmou que as carnificinas das arenas pararam por ordem dos imperadores cristãos.[6] W. E. H. Lecky escreveu:

Praticamente não há nehuma reforma tão importante na história moral da humanidade como a supressão dos espetáculos dos gladiadores, uma façanha que tem de ser atribuída quase que exclusivamente à igreja cristã.[7]

Sacrifício humano

Ao longo dos tempos do Antigo Testamento, as sociedades praticavam sacrifícios humanos. Os sacrifícios de crianças eram comuns entre os seguidores de Baal em Canaã. Nos arredores da antiga cidade de Megido, no Norte de Israel, arqueólogos descobriram os restos mortais de bebês sacrificados no templo de Astarote durante o reinado de Acabe e Jezabel.[8] Alguns reis de Israel se afastaram de Deus e sacrificaram os próprios filhos a Moloque, deus adorado pelos cananeus.[9] A prática de sacrifícios humanos não se limitava aos cananeus ou aos reis de Israel não tementes a Deus. Apesar de o sacrifício humano ter sido proibido em todo o Império Romano nos tempos de Jesus, os cristãos encontraram o mesmo costume séculos mais tarde em terras pagãs. Antes de o Evangelho lhes ter sido levado por São Patrício, os irlandeses sacrificavam prisioneiros de guerra aos deuses da guerra e recém-nascidos aos deuses da colheita.[10] O sacrifício humano era também praticado pelos pagãos da Prússia e da Lituânia, até o século 13. Isso chegou ao fim por causa da influência cristã.

Suicídio

Durante o Império Romano, tomar a própria vida foi muitas vezes considerado um ato nobre, e o suicídio foi amplamente praticado. Muitos renomados filósofos e escritores romanos, assim como alguns imperadores, suicidaram-se. Também era algo usado como um castigo, pois imperadores às vezes ordenavam as pessoas com as quais estavam descontentes a “abrirem suas veias”. Apesar de nada proibir os cidadãos romanos de porem fim às próprias vidas, o suicídio não era permitido aos escravos, pois eram considerados um patrimônio. A mesma proibição se aplicava aos soldados, a menos que estivessem cercados pelos adversários no campo de batalha.

Os cristãos pregam que somente Deus, por ser o que dá a vida, tem a prerrogativa para pôr fim a ela. Os líderes cristãos nos séculos três e quatro, tais como Clemente de Alexandria, Gregório de Nazianzo e Eusébio, eram contra o suicídio. Os concílios da Igreja, entre os século quatro e catorze também se opuseram ao suicídio. Tomás de Aquino classificou o suicídio como moralmente errado, por ser um pecado contra a natureza:

Todo ser se ama naturalmente a si mesmo; matando-se, comete também injustiça contra a comunidade, da qual é parte integrante; é um pecado contra a vida, dádiva de Deus.[11]

Para saber mais sobre suicídio, leia A Prática do Cristianismo: Os Dez Mandamentos (Salvaguardar a Vida Humana, 3ª Parte).

Para os romanos dos dias de Jesus, o valor dado à vida humana era muito baixo. Tanto quanto se sabe, a matança ou abandono de recém-nascidos não evocava indignação moral. Em geral, tirar a própria vida não era visto como moralmente errado. Assistir aos gladiadores se materem uns aos outros para fins de entretenimento era considerado normal. (Hoje, muitos filmes eximbem cenas teríveis de violência, morte e assassinato; a diferença, entretato, é que, apesar de não serem espiritualmente saudáveis, trata-se de uma encenação e não de uma morte real.)

A vida valia muito pouco nos tempos antigos. No entanto, conforme o cristianismo se espalhou por todo o Império Romano, a vida se tornou mais valorizada. A mensagem de que a vida humana é sagrada e  o entendimento de que tirar a vida de um ser humano inocente é moralmente errado criou raízes. O impacto da mensagem cristã ao longo dos séculos trouxe uma compreensão moral em relação à vida humana, que se espalhou por todo o mundo e tem ajudado a mudar o mundo.


Nota

A menos que indicado o contrário, todas as referências às Escrituras foram extraídas da “Bíblia Sagrada” — Tradução de João Ferreira de Almeida — Edição Contemporânea, Copyright © 1990, por Editora Vida.


[1] Alvin J. Schmidt, How Christianity Changed the World (Grand Rapids: Zondervan, 2004).

[2] Gênesis 1:27.

[3] Salmo 8:5.

[4] João 1:1–2, 14.

[5] Lucius Annaeus Seneca, On Anger 1.15.2.

[6] Jerome Carcopino, Daily Life in Ancient Rome (New Haven: Yale University Press, 1940), 247.

[7] W. E. H. Lecky, History of European Morals: From Augustus to Charlemagne (New York: D. Appleton, 1927), 73.

[8] H. H. Halley, Halley’s Bible Handbook (Grand Rapids: Zondervan, 1965), 198, 206.

[9] 2 Reis 16:3, 21:6.

[10] Thomas Cahill, “Ending Human Sacrifice,” Christian History 60 (1998): 16.

[11] Thomas Aquinas, Summa Theologica, trans. Fathers of the English Dominican Province (Westminster, MD: Christian Classics, 1948), 2:1463.

 

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